A vida é bela (1997), de Roberto Benigni



          Depois de acabar o filme, enquanto conversava com amigos sobre o magistral longa que eu havia acabado de consumir, consegui entender o que faz de "A vida é bela" um filme tão incrível. O título é muito autoexplicativo, e enganam-se aqueles que acham que o objetivo principal do filme é relatar a vida em um campo de concentração, as consequências do nazismo e fascismo e a vida durante a guerra. Acredito que esses sejam temas que apenas circulam a trama principal. O objetivo que o filme tem enquanto obra crítica é mostrar que a vida realmente é bela para alguns, mesmo quando a sociedade não quer que ela seja, e que o otimismo e amor de um homem podem até desconstruir a vida em um campo de concentração no qual ele e seu filho estão aprisionados. As cenas do filme são excelentes no quesito de diversidade de sentimentos em uma mesma sequência. Em muitas cenas eu não sabia se chorava, ria ou ficava tenso. Mesmo se passando em um campo de concentração, mesmo lidando com a morte total da humanidade no período que a humanidade viveu durante o nazismo e o fascismo, "A vida é bela" consegue ser um filme belo. O filme é italiano, dirigido e atuado por Roberto Benigni. Guido (Roberto Benigni) é um judeu dono de uma livraria, casado com Dora (Nicoletta Braschi) e pai de Giosué (Giorgio Cantarini), e com certeza o homem que leva a vida com a maior serenidade alcançada pela humanidade. A família é levada a um campo de concentração nazista, os pais são forçados a trabalhar, e Giousé precisa se esconder constantemente dos soldados para não ter o mesmo fim das outras crianças. Para fazer com que o filho não seja psicologicamente atingido pela rotina no campo de concentração, Guido conta para o filho que na verdade todos ali está jogando um jogo, e trabalhando por pontos para conseguir o prêmio máximo: um tanque de guerra. O filme é lindo e aterrador ao mesmo tempo. 

Os sonhadores (2003), de Bernardo Bertolucci - recomendo esse filme com todas as minhas forças.

          Henri Langlois foi um dos maiores arquivistas de materiais cinematográficos da história do cinema, e obviamente um dos maiores cinéfilos de todos os tempos. A sua relevância no filme Os sonhadores (2003) é baseada em um de seus legados: o Cinémathèque Française, uma organização de cinéfilos que até hoje tem um dos mais amplos arquivos de cinema da história. O fascínio de Matthew pelo Cinémathéque, um jovem que decidi partir dos Estados Unidos para aprender sobre cinema e a língua francesa em Paris, leva o garoto a trilhar caminhos muito diferentes daqueles que estava acostumado em seus primeiros dias na capital francesa. Quando conhece Isabelle e seu irmão Theo, ambos cinéfilos como ele, a vida de Matthew em Paris começa a se transformar, com sentidos e rumos diferentes dos de praxe.



           Além do clima cinematográfico, e do fervor nas discussões sobre cinema entre os três jovens, a política e as manifestações que estavam acontecendo durante a década de sessenta na França são particularmente marcantes. O fervor das manifestações estudantis que buscavam o pensamento progressista e libertário, afirmando que o conservadorismo deveria ser deixado de lado, mostra uma sociedade que buscava mais liberdade. O tipo de liberdade que não é de graça, e sim conquistada, e no caso da França de 1968, as lutas sociais concretizaram-se em uma grande greve no dia 30 de maio de 1968. É nesse clima político que os jovens fumam, bebem, transam, debatem, consomem cinema e uns aos outros. Matthew em alguns momentos é contraditório em seu discurso, principalmente quando diz que é contra qualquer tipo de violência, mas não faz críticas ferrenhas ao governo dos EUA que estava envolvido na Guerra do Vietnã. O fato de Theo ter um estátua do Mao no seu quarto e recitar passagens do Livro Vermelho diz muitos sobre os seus ideais. Durante todo o longa, Isabelle não se envolve nas conversas. Ela prefere falar dos prazeres da vida, e não apenas discursar, mas também experimentar.



          A primeira visita à casa dos irmãos, Matthew conhece um pouco mais da família dos dois. A mãe britânica aparece apenas em duas cenas, e não tem uma maior participação. O pai, poeta que fez um monólogo durante o primeiro jantar com Matthew, não tem uma relação muito boa com os filhos. Quando os dois decidem sair para viajar por alguns dias, Matthew, a pedido de Theo e Isabelle, compartilha da casa vazia com os dois irmãos franceses. O quadro de Delacroix que Matthew encontra no seu quarto provisório diz muito sobre alguns conceitos que o filme aborda e discute: a liberdade, a arte sem pudor e o repúdio a tudo que é autoritário e conservador. Nos dias em que os três jovens passam juntos, além de discutirem sobre cinema e de beberem os vinhos finos dos pais de Theo e Isabelle, transam muito entre si e tentam descobrir que tipo de relação está acontecendo naquela casa parisiense. Já aviso de antemão que o filme não tem pudor nenhum em retratar as cenas de sexos. A primeira transa entre Isabelle e Matthew acontece no chão da cozinha, enquanto que Theo prepara um omelete com um cigarro pendendo do canto da boca. Talvez não seja o melhor filme para os conservadores de plantão. As cenas de nudez, em minha opinião, retratam a busca pela liberdade, a nudez de preconceitos e total despreocupação com padrões. Recomendo esse filme com todas as minhas forças!




Algumas músicas da semana

1. One point perspective - Tranquility base hotel & casino (Arctic Monkeys)

I fantasize, I call it quits
I swim with the economists
And I get to the bottom of it for good
By the time reality hits 
The chimes of freedom fell to bits 
The shining city of the fritz
They come out of the cracks
Thirsty for blood




2. The happiest days of our lives - The wall (Pink Floyd):

When we grew up and went to school
There were certain teachers who would 
Hurt the children any way they could
By pouring their derision
Upon anything we did
Exposing every weakness




3. Heaven knows I'm miserable now (The smiths):

I was happy in the haze of a drunken hour 
But heavens knows I'm miserable now
I was looking for a job, and then I found a job 
And heaven knows I'm miserable now



4. Feel - Manipulator (Ty Segall):

Feel the creeps 
In the sky
Let them live
In each other's eyes
Existing in the mind 
Existing in the night
Watching you
Watching me 
Watching what we do








"A Sombra do Vento", de Carlos Ruiz Zafón

     



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     O crescimento do autoritarismo, o início de uma guerra e as mudanças de uma sociedade perante maus presságio são sempre fatores difíceis de serem percebidos pela grande parcela da população; a realidade brasileira demonstra isso muito bem. As pessoas trabalham, têm relações, saem nos finais de semana, escrevem, comem, bebem, e em suma, seguem com suas vidas. "A Sombra do Vento" é um livro que acima de muitas coisas consegue demonstrar isso muito bem. Carlos Ruiz Zafón arquiteta sua trama em duas principais linhas do tempo - o pós guerra em Barcelona, e o período antes dos terríveis acontecimentos - ambos marcados pela presença dos livros, de leitores e de relações pessoais. O romance consegue demonstrar o amor em diversas esferas; o amor pelas palavras, pelas pessoas e pela vida. Mas também relata o ódio - o sentimento que consegue matar, extinguir às cinzas e destruir instituições já muito bem estabelecidas. Daniel Sempre trabalha em uma pequena livraria nas ruas de Barcelona. Como é muito provável de se deduzir, compartilha do amor pelo livros devido à influência do seu pai. Em uma madrugada em que os pensamentos do filho do livreiro beiravam a sombria morte de sua mãe, o pai do garoto decide levá-lo até o Cemitério dos Livros Esquecidos. Lá o pai diz para o filho escolher um livro, algum que tivesse de algum modo lhe chamado atenção, que poderia preencher os vazios da vida do garoto e acalentar seus sentimentos durante dias difíceis. Nos dias seguintes, Daniel se apaixona por um livro chamado "A sombra do vento", e fica estranhamente interessado na misteriosa história de vida e do desaparecimento de Júlian Carax, o escritor do romance. Ao longo dos anos o autor torna-se um amigo próximo, mesmo tendo Daniel nunca o encontrado, mas as dúvidas que pairam sobre sua cabeça o fazem seguir cada vez mais as pistas que o desaparecido escritor deixou para trás. Por muito tempo baseia seu projeto de vida em saber mais da história do autor. Quer saber por que Julian foi morar em Paris, o que fazia lá, quem era o amor da sua vida, quais foram suas decepções e conquistas. A segunda linha temporal da narrativa toma conta de relatar a vida de Julian. Essa parte da história é contada através de relatos, confissões e cartas de amigos, amores e inimigos de Julian. Zafón consegue criar personagens muito límpidos no quesito personalidade; quase todos são reais e realmente carismáticos. Fermín, perseguido por policiais e forçado a morar nas ruas sombrias da cidade, torna-se grande amigo de Daniel e seu pai. Quando os dois descobrem o talento e a paixão daquele homem enigmático para com os livros, decidem empregá-lo na livraria familiar. Em minha opinião, Fermín é o personagem mais carismático e engraçado da obra inteira, muito mais que Daniel ou qualquer outro personagem "principal" da trama. A violência que assola a Espanha, e principalmente Barcelona, no período da Guerra Civil Espanhola é muito marcante na vida dos personagens. Algumas passagens do livro foram difíceis de engolir - algumas tramas que me lembraram novelas mexicanas, mas em suma a história foi bem marcante para mim. Para mim é difícil enquadrar esse livro em algum estilo, pois acho que ele consegue se encaixar em um mistério policial, mas também com um pé no horror e outro nas relações/intrigas familiares. A fumaça do cigarro que cobre a cara de um homem na penumbra das noites de outono é um mau presságio para Daniel - para o leitor, a caracterização de um possível "vilão". Esse homem, com feições misteriosas e com objetivos ainda mais obscuros, procura os livros de Carax com o único objetivo de queimá-los. Essa é a força motriz que o leva para a livraria dos Sempere, e essa ambição também é algo que move a trama dos personagens de forma frenética. Quero saber um pouco de vocês, já leram "A Sombra do Vento"? Se você já leu, acha que eu deveria continuar lendo os próximos volumes? Boa leitura. 



Um estudo em vermelho, de Arthur Conan Doyle


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          'Um estudo em vermelho' é narrado, como todos os romances do Sherlock Holmes se não estou enganado, através das impressões do ex-militar e médico John Watson. Esse foi o livro que apresentou o detetive da Baker Street para o mundo literário, até mesmo quando ele e Watson ainda não vivam na 211B Baker Street. Watson chega à Londres após uma traumatizante experiência na guerra, buscando estabilidade financeira, social e habitacional. Londres já era uma cidade cara no século dezenove, o que motiva o ex-militar a procurar alguém que esteja disposto à compartilhar um apartamento, ou até mesmo um quarto na capital inglesa. O primeiro contato entre os dois que serão os maiores apoiadores das investigações da Scotland Yard se dá em uma sala onde Holmes está praticando um experimento biológico, mostrando já o caráter extremamente racional e peculiar do personagem. Ler esse livro depois de assistir à incrível série da BBC Sherlock tornou difícil não imaginar Benedict Cumberbatch interpretando o detetive inglês. 


          Os primeiros acontecimentos da narrativa expressam a inquietude de Watson em relação ao seu novo colega de apartamento; uma mescla de fascínio e estranheza seria a melhor caracterização para a atitude do médico em relação a Holmes. Durante os primeiros dias na Baker Street, Watson não faz ideia da ocupação da pessoa com quem está compartilhando uma casa, portanto começa a escrever sobre seus hábitos e passatempos, tentando formar quadros e tabelas que relacionem os conhecimentos de Holmes, analisados através do olhar minucioso de John Watson. Alto conhecimento em música, linguagem, química, literatura e outras áreas do conhecimentos que não convergem em apenas uma profissão definida, deixando o nosso narrador observador ainda mais inquisidor. 

          Quando a verdadeira profissão de Holmes é revelada, uma profissão que aparentemente ainda não era de praxe na comunidade londrina, Watson começa a entender os profundos conhecimentos do detetive em focos de estudo tão diversificados. 'A ciência da dedução', talvez a tradução seja um pouco diferente desse sentido literal que eu acabei de dar, criada por Sherlock Holmes, demonstra a importância de um olhar atento a todos os acontecimentos e variáveis que resultam em determinado produto. Com essa nova ciência em desenvolvimento, Holmes consegue explicar como crimes foram cometidos apenas analisando o que está disposto ao seu redor na cena do crime, abismando todos os detetives da Scotland Yard. 

          Nesse romance em específico, acompanhamos a primeira investigação de Holmes narrada e acompanhada de perto pelo Dr. Watson, a qual é denominada 'Um estudo em vermelho'. Fiquei pensando no duplo sentido que esse nome possivelmente apresenta, pois os personagens, ao longo da narrativa, comentam sobre o possível caráter político do assassinato que estavam investigando. Alguns detetives da Scotland Yard chegam até a afirmar que quase todos os assassinatos que estavam acontecendo na Europa durante aquela época tinham relação direta com movimentos políticos. Achei um análise válida, mas não sei se não é apenas uma divagação da minha mente. Talvez o nome apenas relacione o sangue que havia sido usado para escrever uma palavra em Alemão na cena do crime, o que acabaria colocando os detetives da polícia londrina em um rumo errado da investigação, não fosse pela perspicácia de Holmes. 


          Recomendo a leitura do livro no original para quem quer praticar um pouco do seu Inglês. O único empecilho durante a leitura talvez seja o uso de algumas gírias inglesas e uma gramática um pouco mais ultrapassada do Inglês britânico. Tirando isso, não é uma leitura muito difícil, não. Vocês já leram algum livro do Holmes? O que acharam? 



Assisti à primeira temporada de Bates Motel e o que eu achei da série.

          Antes de começar a assistir à série, eu já tinha visto o filme "Psycho" do Hitchcock, o que fez com que eu achasse apenas mais interessante acompanhar o passado dos personagens que eu tinha tido o primeiro contato com o thriller incrível do diretor já mencionado. A cidadezinha do interior de Oregon que funciona como cenário para Bates Motel tem todo um clima de cidade do interior característica de filmes/séries/livros de horror. Montanhas com topos cobertos de neve, um porto em funcionamento, florestas de pinho, escola com professores estranhos e, obviamente, um hotel de beira de estrada administrado por uma família de psicopatas (bem, nem todos são psicopatas). 


          A série tenta mostrar o que teria acontecido na vida do Norman Bates, que é o dono do Bates Motel no filme do Hitchcock. Quem já viu o longa sabe que Norma (mãe do Norman) apenas aparece no final do filme. Após a morte do marido, Norma tenta iniciar uma nova vida com o filho em uma cidade em Oregon; compra um hotel na estrada que estava sendo leiloado devido a dívidas do antigo dono, e muda o nome do hotel para Bates Motel. A série começa com os dois dentro de um carro, andando em direção a nova vida que querem construir com aquele hotel. Quando a característica residência da família Bates é apresentada na série, eu realmente fiquei impressionado com essa diferente representação de um local tão característico para o mundo do thriller/horror. 

Bates Motel (2013)
Psycho (1960)



          A série apresenta o lado adolescente de Norman em inúmeras ocasiões, seja na escola com seus dilemas em encontrar amigos, ou com indecisões amorosas. O modo inocente de agir do garoto somado com a proteção que Norma deposita nele geram cenas que produzem muita raiva para quem está assistindo - até você entender o motivo de alguns atos. Logo no primeiro episódio já conseguimos ver que existe algo errado no comportamento dos dois. Eu fiquei me perguntando se seria o caso de ambos serem psicopatas; ou apenas um deles. Alguns personagens secundários são muito interessantes, como por exemplo a Emma, uma menina que sofre de uma doença respiratória e acaba se apaixonando pela personalidade insossa do Norman. Uma das cenas mais engraçadas da série talvez seja protagonizada por ela, quando recebe um cupcake "mágico" e fica filosofando sobre assuntos pertinentes (ou nem tão pertinentes assim). O próprio pai de Emma é um personagem que eu queria ter visto mais durante os episódios; um britânico que tem a taxidermia como seu principal passatempo. Dylan é o irmão mais velho de Norman, trabalha em uma plantação de maconha na cidadezinha e no início da temporada age como um outsider da família. 


          Gostei bastante do final da temporada, não foi muito surpreendente, mas gostei bastante. Vamos ver como Bates Motel vai continuar depois dessa primeira temporada acima da média.