Eu
pensei em escrever sobre muitas coisas do dia em que eu finalmente peguei meu
passaporte. Sobre a viagem até a serra, o precoce clima de outono, sobre
algumas árvores que eu não tinha prestado atenção nas outras vezes, o café, a
comida, e o fato de eu ter descoberto que dentro do passaporte existe um chip.
Pensei em falar sobre quem me acompanhou; sobre o livro que levei, mas que
acabei não lendo porque sei que ler no carro sempre me dá dor de cabeça
(sinceramente não sei por que continuo levando livros em viagens de carro).
Mas,
algo muito mais consistente marcou esse dia para mim, algo que não tem nenhuma
relação com o meu passaporte, nem mesmo com o que estava programado no meu itinerário.
Aconteceu quando eu estava entrando no prédio da Polícia Federal, o qual é
feito de vidro, possibilitando quem está na rua de olhar para dentro do recinto.
Na PF existe um fluxo constante de imigrantes, porque é esse órgão que concede
os vistos para quem está entrando no Brasil por motivos diversos. Perto de onde
moro, o fluxo de pessoas oriundas do Haiti e de alguns países da África é bem
constante (esses dias fiz uma apresentação na faculdade baseada em um artigo
sobre o papel da mulher haitiana no ambiente da minha cidade, de tão pertinente
que esse assunto está sendo). Não quero me estender nesse tópico agora, mas
acho importante salientar que estes imigrantes vêm para o Brasil por motivos e
histórias diversas.
Voltando
ao prédio e a situação. Quando eu estava indo abrir a porta, notei que um grupo
de imigrantes estava saindo do prédio no exato momento em que eu estava
entrando. Eles eram negros, mas sinceramente não sei dizer se eram originários
do Haiti ou talvez de algum país Africano, apenas notei pela língua e pelo modo
de se vestirem que não eram do Brasil. Fiz o que teria feito em qualquer
situação; abri a porta e a segurei para que eles saíssem antes que eu entrasse –
nada mais do que educação. Eu tratei esta situação como algo muito trivial, mas
enquanto estava esperando o elevador descer, olhei de esguelha para fora do
prédio (de vidro) e vi duas moças que estavam no grupo acenando avidamente para
mim com uma alegria estampada no rosto. Aí ficou uma dúvida na minha cabeça;
será que elas trataram essa situação como algo muito fora do normal, por terem
passado por situações nada agradáveis em um país totalmente diferente; ou será
que sofreram um choque de cultura. Queria muito saber o nome delas, ter tempo
de parar e conversar sobre o motivo de estarem aqui e de onde vieram.
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